Quando a medicina chega aos seus limites conhecidos, muitas histórias passam a ser sustentadas por dois pilares que não se anulam: a ciência, construída ao longo de décadas de pesquisa, e a fé, que oferece suporte emocional quando as respostas ainda não existem.
A trajetória de Luiz Fernando Mozer, de 37 anos, de Cachoeiro de Itapemirim, ilustra como esses dois caminhos podem se cruzar.
Luiz Fernando sofreu um grave acidente durante uma competição de motocross, no início de dezembro, após a colisão com outra motocicleta durante um salto.
A queda foi violenta e, ainda no local, ele relatou não sentir as pernas. Exames confirmaram o diagnóstico mais severo possível: uma lesão medular completa, com ruptura total da medula e da coluna vertebral.
“Os médicos explicaram para a gente de uma forma muito direta. Disseram que foi como se uma tesoura tivesse cortado um fio. Foi exatamente isso que aconteceu”, relata a irmã, Carla Aparecida do Nascimento Mozer.
Nova realidade
O impacto do acidente foi imediato e profundo. Luiz Fernando, que levava uma vida ativa e trabalhava como pintor automotivo, precisou interromper completamente a rotina.
Além da paralisação profissional, a família também foi separada fisicamente, já que ele precisou ser transferido para outra cidade em busca de tratamento.
“Ele teve que parar de trabalhar do dia para a noite. A vida financeira, a rotina, tudo mudou. Meus pais ficaram sozinhos, eu não fico perto dele. Mudou toda a dinâmica da nossa família”, conta Carla.
Um diagnóstico considerado irreversível
Diante de um quadro considerado irreversível pela medicina tradicional, a família encontrou amparo na fé.
A espiritualidade, que sempre esteve presente no convívio familiar, ganhou ainda mais força após o acidente.
Fé sem barreiras religiosas
Igrejas diferentes, crenças distintas e comunidades diversas se uniram em uma grande corrente de oração.
“A gente nunca teve divisão por religião. Eu sou da Igreja Batista, meu irmão é católico, minha mãe frequenta a Igreja Adventista. Quando isso aconteceu, todo mundo se mobilizou. Cada um foi acionando grupos de oração, independentemente da igreja”, explica a irmã.
As orações passaram a fazer parte da rotina diária. Carla relata que acordava ainda de madrugada para rezar, enquanto a mãe e a cunhada mantinham momentos constantes de oração ao longo do dia.
Para a família, a fé se tornou uma forma de resistência emocional diante do sofrimento.
A descoberta da polilaminina
Ao mesmo tempo, a ciência continuava sendo buscada com atenção. Enfermeira, Carla passou a estudar detalhadamente o diagnóstico do irmão.
Ela sabia que as chances eram mínimas, mas procurava compreender se havia qualquer possibilidade, por menor que fosse.
“Quando ele disse que não sentia as pernas desde o momento da queda, eu já sabia que era algo grave. Minha esperança era que fosse um hematoma, algo reversível. Mas a ruptura era completa”, explica.
Foi nesse momento que Carla se lembrou de uma mensagem antiga recebida de uma colega de hospital sobre a polilaminina, uma substância experimental em estudo para lesões medulares.
Movida pela insistência de buscar alternativas, ela começou a pesquisar artigos científicos produzidos por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A polilaminina é resultado de quase 30 anos de estudos e se baseia em uma proteína naturalmente presente no corpo humano.
Nos últimos anos, pesquisas avançaram e mostraram respostas positivas em alguns pacientes com lesão medular, ainda que em caráter experimental.
Autorização judicial e tratamento experimental
Após uma corrida contra o tempo, que envolveu médicos, pesquisadores, o laboratório responsável e o Judiciário, a família conseguiu autorização para o uso excepcional da substância.
O procedimento foi realizado na Santa Casa de Misericórdia de Cachoeiro de Itapemirim, após cirurgia de estabilização da coluna.
O caso mais grave já tratado pela equipe
O médico Olavo Borges Franco, integrante da equipe responsável pela aplicação, explica que o caso de Luiz Fernando é o mais grave já tratado durante o desenvolvimento da pesquisa.
“Ele teve a lesão mais severa entre todos os pacientes que receberam a polilaminina até hoje. Além de ser uma lesão funcional completa, houve uma secção total da medula e da coluna”, afirma o médico.
Segundo Olavo, a aplicação foi feita por via percutânea, de forma minimamente invasiva, com a injeção da substância acima e abaixo da área lesionada.
Apesar da gravidade, o procedimento ocorreu sem intercorrências e agora o tratamento ainda está numa fase muito precoce e a evolução pode acontecer ao longo dos dias, semanas ou meses.
“Ainda é cedo para conclusões, mas seguimos otimistas, mesmo diante de uma condição anatomicamente desfavorável”, explica Olavo Borges.
Pequenos sinais, grande expectativa
Para a família, pequenos sinais observados após o procedimento já reforçam a esperança.
Testes iniciais de sensibilidade indicaram respostas a estímulos, algo que, para eles, vai além de um dado clínico.
“A gente não duvida, em nenhum momento, que foi Deus. Eu costumo dizer que fui apenas um instrumento. Quem conduziu tudo foi Deus”, afirma a irmã do paciente.
Oração como ato de resistência
Enquanto a ciência segue seu ritmo, exigindo tempo, evidências e novos estudos, a família continua fazendo o que sempre fez desde o acidente: orar.
Para eles, a polilaminina representa a ciência em ação, mas também uma resposta que nasceu da fé.
A história de Luiz Fernando não encerra um debate entre razão e crença. Pelo contrário.
Ela mostra que, em momentos extremos, fé e ciência podem caminhar juntas, uma oferecendo método e pesquisa, a outra sustentando a esperança quando o futuro ainda está em construção.
Apoio do Governo
O Governo do Estado anunciou que pretende apoiar a pesquisa, disponibilizando hospitais da rede pública como centros de referência para os estudos exigidos pela Anvisa.
A iniciativa visa oferecer infraestrutura e recursos para ampliar a investigação científica sobre a polilaminina no tratamento de lesões medulares.
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