O tempo que não temos, o tempo que se permuta por sustento, ou melhor, de sobrevivência, que não controlamos, mas que se camufla em notas de dinheiro e dita que o trabalho é o que dignifica o homem. Porém, qual é a dignidade a ser seguida ou atribuída, quando o que se percebe é que somos apenas a linha anexada à peça que se entrelaça ao produto final do mercado de trabalho?
Liberdade é o que menos desfrutamos, já que moldamos nossas vidas ao tempo que prestamos serviços, e quando alcançamos as coisas que gostamos ou sonhamos são efêmeras – horas, ou dias.
O eixo que nos conduz é o ritmo insano do maquinário laboral – produzir, trabalhar, dormir, e comer, e quando der – respirar alguns momentos de distração. Passamos a produzir a meta para sustentar o peso da prisão invisível sustentada pela venda do tempo, que acreditamos, ingenuamente, ter posse.
O poder aquisitivo também não se restringe ao fato de comprar um produto “das prateleiras”, mas da possibilidade de escolher a forma em que se deseja passar ou gastar o tempo, que até mesmo para os mais abastados, nem a eles o tempo cabe totalmente, apenas ludibria e ofusca a realidade de que no fim das contas – a nada e a ninguém pertence.
Décadas podem se passar, todavia não há como manipulá-lo nem mesmo com os cálculos mais complexos – apenas uma fração dele pode ser entendida, mas sua completude não.
O passar do tempo definido em segundos, minutos e horas, traduzido por despertadores, sinais que identificam intervalos, o início, meio e o fim da jornada de trabalho, já não assusta mais, pois a muralha que havia sustentado e separando o social do laboral – há anos, deixou de ser impenetrável, e apenas funciona por sinalização de que um dia esteve na história de alguns.
Assim, a separação entre o que realmente somos, e o que desempenhamos se dissolvem cada vez mais no mar do mercado que entalha suas peças às paredes erguidas com o suor e os sonhos pré-definidos e destruídos em nome da dignificação do ser que se perde de sua ilha – se afastando mais e mais do seu eu – à deriva da moeda de troca.
Assim, a medida de tempo que pode ser definida, explicada, e medida por diferentes formas e pessoas, nada passa do fato de ser o mesmo produto, com diferentes roupagens em conformidade com a lente que o observa e traça a linha do momento desejado.
Apesar de que a nossa habilidade em definir o passado, presente, e futuro seja conhecida como racional, e de nos autoafirmamos como a espécie mais eficiente e capaz de dominar o tempo; contudo não há como controlar algo que não pode ser tão bem compreendido, já que por mais que tentamos não há fórmula que trace o período certo que tanto vivemos esperando: o futuro, os planos, os sonhos.
A vida de uma pessoa é feita de lembranças de momentos vividos, poucas referências são atribuídas aos sonhos, mas àquilo que se aprendeu e viveu.
Sendo assim, viva os momentos, crie lembranças, não deposite todas as suas fichas no futuro, já que esse tempo nem existe e nem mesmo é certo de completude para alcançar o tão esperado momento digno de recompensa, que por anos as relações e as memórias são sacrificadas ao incerto, à espera do momento preciso que se estabelece em uma realidade paradoxal.