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Ato nacional pelo fim da violência contra as mulheres

ESCRITORAS CACHOEIRENSES - Dandara Dias. A autora narra sua trajetória como mulher negra, do campo à literatura, para expor as violências que atravessam essas vidas desde a infância. A educação e a escrita aparecem como caminhos de resistência, afirmação e enfrentamento ao racismo e ao machismo.

Pela vida das mulheres negras!

Eu sou Dandara Dias de Oliveira, mulher negra, filha de lavradores da comunidade Pedra do Itabira, e começo dizendo: a minha história também é um território de luta contra a violência que insiste em atravessar as vidas das mulheres negras.

Nasci na zona rural, onde o vento carrega segredos e a terra guarda memórias. E aprendi cedo que para as mulheres negras do campo, a violência não é só a física: é a violência da exploração do trabalho, da invisibilidade, do não reconhecimento. Minha mãe, minhas tias, minhas vizinhas — mulheres que, mesmo cansadas, nunca deixaram de se levantar. É por elas que estou aqui.

Como professora, entendi que a violência contra a mulher negra começa muito antes da agressão: ela começa quando nossas meninas não se veem representadas, quando são silenciadas na sala de aula, quando não são consideradas inteligentes, bonitas ou capazes. Na escola, eu luto todos os dias para quebrar esse ciclo — porque uma menina negra que acredita em si mesma é uma mulher adulta a menos sendo destruída pelo racismo e pelo machismo.

Como escritora, uso a palavra como faca e escudo. Escrevo porque sei que a violência também é o apagamento: apagamento da nossa história, da nossa voz, da nossa dor, do nosso brilho. Quando escrevo na coluna “Escritoras Cachoeirenses”, eu planto sementes de cura — porque mulher negra que escreve não aceita ser calada.

Como Imortal da Academia Cachoeirense de Letras, carrego o compromisso de lembrar que literatura também é instrumento de combate. Não é sobre glamour. É sobre dizer, com toda firmeza: não aceitaremos mais que nossas violências sejam romantizadas, naturalizadas ou justificadas.

Como historiadora, preservo a memória da minha comunidade porque sei que a violência contra a mulher negra é histórica e estrutural. Quando registro as vozes dos mais velhos, quando protejo a oralidade, estou dizendo ao mundo que nossas mulheres não serão mais colocadas no rodapé da história. A mulher negra tem nome, tem trajetória, tem legado — e tem o direito de viver sem medo.

Na Comissão de Justiça e Paz e na Pastoral Afro-Brasileira, aprendi que a fé não pode ser cúmplice do silêncio. A fé que eu pratico é fé que denuncia, que abraça, que enfrenta. Sou Ministra da Palavra, mas também sou ministra da justiça — e digo hoje, diante de todos: não existe evangelho verdadeiro onde mulheres negras são violentadas, assassinadas e esquecidas.

Como agente cultural, artista, ambientalista, educadora social e ativista antirracista, uso a arte como arma. O Centro Cultural Dandara nasce de uma certeza: quando uma mulher negra se reconhece como sujeito da própria história, a violência perde força.

A Biblioteca Lydia Rosa é meu gesto de carinho para todas as meninas negras que precisam encontrar nos livros aquilo que muitas de nós só encontramos adultas: a certeza de que negras também sonham, também lideram, também vencem.

O Museu Caboco Josias, é meu lembrete diário de que nossos ancestrais nos deram coragem para dizer basta — basta ao racismo, basta ao machismo, basta à violência que atravessa nossas vidas há séculos.

E é por tudo isso que estou aqui hoje.

Estou aqui porque cada dado de feminicídio tem um rosto negro por trás.

Estou aqui porque mulheres negras ganham menos, morrem mais, são mais agredidas, invisibilizadas e silenciadas.

Estou aqui porque o Estado ainda não nos protege.

E porque a sociedade ainda normaliza nossa dor.

Mas estou aqui, sobretudo, para dizer:

Nós não vamos aceitar.

Nós não vamos recuar.

Nós não vamos silenciar.

A luta contra a violência à mulher negra é a luta da minha vida — não porque eu a escolhi, mas porque ela me escolheu no momento em que nasci em um corpo negro, feminino e rural.

E eu digo com a força de todas as minhas ancestrais:

Nós somos o grito que não pôde ser dado.

Somos o livro que não pôde ser escrito.

Somos a história que não pôde ser contada.

Somos a vida que não pôde ser vivida — e agora será.

Pelo fim da violência,

Pela vida das mulheres negras,

Pela dignidade dos nossos corpos e territórios.

Eu sou Dandara.

E enquanto eu existir, nenhuma de nós lutará sozinha.

Axé.

Escritora Dandara Dias
Dandara Dias. Mulher, negra, filha de lavradores, professora, historiadora, artista, agente cultural, educadora social, ativista ambientalista e anti racista. Descobriu-se negra tardiamente, devido ao racismo estruturado em nossa sociedade e atua como ativista antirracista desde então. Encontrou-se escritora aos 28 anos, após retratar suas lutas através da escrita. Participa do grupo de Escritoras Cachoeirenses e publica textos aos domingos no Dia a Dia. Participou de algumas antologias. Valoriza a história local e a oralidade. Além disso, é Assessora Técnica da Comissão de Justiça e Paz, Diocese de Cachoeiro de Itapemirim, também coordenadora diocesana da Pastoral Afro-Brasileira. Ministra da Palavra na CEB’s Comunidade Nossa Senhora da Penha, Itabira, assim como vice-presidente da Associação da localidade Pedra do Itabira. Idealizadora dos projetos “Dandara Vive em Mim”, “Histórias que meus avós contavam”, “Kitanda Cultural”, “Sou da Quebrada”, “Espaço cultural Dandara”, este último contém a biblioteca comunitária.

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