Estamos começando uma série de quatro matérias com dados históricos de Cachoeiro de Itapemirim e dos municípios do entorno.
O nosso entrevistado é o historiador Gilson de Souza Eleutério, tesoureiro da ONG Amigos do Trem Regional do Espírito Santo, um estudioso dos temas que envolvem a vida sobre trilhos, mas também de fatos que nos fizeram chegar até aqui.
Nessa matéria vamos tratar da escravidão em Cachoeiro de Itapemirim, que foi a cidade do Espírito Santo com o maior número de escravos, exatamente 7.375 dos 22.552 existentes no estado, segundo o historiador.
Gilson conta que os relatos provam que esse grande volume de mão de obra escrava se deve à implantação de cultivo de café. ”Em 1872 o Espírito Santo tinha 82.370 habitantes, sendo 22.552 escravos. Em 1876, os escravos estavam diminuindo no Estado, porém em Cachoeiro aumentou mais ainda”, enfatiza.
O historiador conta que os escravos eram trazidos para Cachoeiro, em sua maioria, por fazendeiros fluminenses e mineiros, alcançando num período o número de 8.403 cativos.
Considerados selvagens, os escravos não eram batizados até 1603, quando o Império Português editou uma lei que obrigava o fazendeiro ou governador local a batizar todos os escravos.
Gilson destaca que em 1720, a igreja católica começou a fazer o registro aqui no Brasil, em Salvador, e se a lei fosse descumprida, o escravo poderia ser confiscado.
“Observando os registros na Catedral de São Pedro, entre 1870 a 1880, verificamos como eram os registros de batismo. Além do nome da criança, mãe, pai, padrinho, colocavam o nome do proprietário do escravo”, esclarece o historiador.
Gilson viaja mais um pouco na história e lembra que com a lei Eusébio de Queiróz, promulgada em 4 de agosto de 1850, foi proibido o transporte intercontinental de escravos.
A proibição não inibiu os fazendeiros, já que o cultivo de café exigia muita mão de obra. Foi nesse momento que começou o tráfico de escravos, segundo Gilson Eleutério.
“Com a vigilância maior nos portos principais, os traficantes usaram portos menos fiscalizados para desembarcar os escravos e o Porto de Itapemirim recebeu navios negreiros da África até 1856, com “vistas grossas” do presidente da colônia”, esclarece.
Vítimas de maus tratos, muitos escravos eram chicoteados, torturados e enforcados, ressalta Gilson. “Eram grandes os números de escravos mortos. O relato aos delegados da polícia era de que tinham se acidentado ou morrido afogados”, detalha.
O historiador acrescenta que a fuga dos escravos era relativamente comum e sempre era noticiada nos jornais com oferta de recompensa pela captura que variava de 80 a 300 mil réis.
“Um escravo, nos dias de hoje, atualizando a moeda, seria o equivalente a R$ 21 mil e a recompensa seria de R$ 5.000,00”, esclarece.
Gilson diz também que as pesquisas indicam que as fugas geralmente eram individuais, mas há registros da fuga de cinco, 15 e até 20 escravos de uma única vez, sendo esta última na fazenda Safra.
“Com as fugas aumentando, começaram a surgir os quilombos no meio das matas, e alguns quilombos prosperavam e chegaram a vender produtos na cidade, pois já tinham muitos comerciantes a favor da causa abolicionista”.
Segundo ele, quando a Lei Áurea foi promulgada em 1888 a Câmara da Província de Cachoeiro se posicionou ao lado dos fazendeiros.
Mas houve também pontos a serem comemorados, destaca Gilson, já que após três meses da Lei do Sexagenário, Cachoeiro alforriou 139 escravos.