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Clube do livro: as leituras do outono

olivia-15-08-2023
Olivia Batista de Avelar

“Ele se pegava pensando, especialmente durante o outono, sobre as terras selvagens e as estranhas visões de montanhas que ele nunca tinha visto, a não ser em seus sonhos.”

JRR Tolkien, A sociedade do Anel

 

Sim, eu sei. Nossa região não tem as quatro estações do ano bem definidas como acontece em boa parte do hemisfério norte. Não temos as folhas amareladas caindo e nem as famosas e tradicionais abóboras que estrelam a estação da colheita em muitos países. Na verdade, o clima se altera muito pouco e os dias continuam, na maioria dos anos, ensolarados e bastante quentes. Apesar disso – de não termos na realidade um outono tão cinematográfico como o que costumamos assistir nos filmes e ler nos autores norte americanos e europeus – sabemos que, a partir de meados desse mês, já podemos aguardar pelas águas de março que fecham o verão e, nos despedindo da temporada de férias escolares e do carnaval, já começamos a nos preparar para a chegada da Páscoa e aqueles que são religiosos guardam o período da quaresma como um tempo de preparação espiritual que antecede a semana santa.

Apesar de diferentes, os pequenos ritos e detalhes que enfeitam a nossa forma de transitar por cada um dos quartos sazonais que costuram a passagem do ano me encantam e me deixam muito feliz. Nossa cultura e culinária também são riquíssimas e podemos desfrutar, nessa época do ano, de pratos como canjicão e torta capixaba. Além de uma infinidade de cafés e chás que ficam muito mais agradáveis de serem saboreados quando deixamos os dias muito quentes para trás. Quando o outono já estiver quase de partida, as festas juninas encerrarão o trimestre outonal e será o momento de acolhermos a chegada do inverno. Ao mencionar aqui nossas tradições e costumes, quero exaltar a beleza e a doçura da nossa maneira de sentirmos e celebrarmos o passar dos meses do ano. Seguimos nossos ritos silenciosos como as árvores que mudam de cor.

Mudamos a forma como olhamos para o mundo e para nós mesmos assim como se alternam as frutas disponíveis a cada estação.

Não estamos no mundo, nós somos o mundo e essas transições externas são também a própria composição da nossa afetividade e da nossa estrutura corporal.

Já deve ter ficado claro, nesse ponto do texto, que o outono é minha estação preferida. Por isso, farei um convite: sugiro aos leitores que gostam de aguçar sua sensibilidade e de lapidar sua percepção que observem como a luz da tarde se transforma quando entramos no mês de abril. Ela fica mais amarela e mais melancólica, tingindo os entardeceres de nostalgia e deixando os prédios mais alaranjados quando a hora do por do sol se aproxima. O aroma que as plantas exalam também muda e isso me faz acreditar que não conseguimos sentir o cheiro do mês de maio em nenhuma outra estação. Para finalizar essa sugestão, eu não poderia deixar de lembrar sobre as quaresmeiras que florescerem no outono e sobre as primeiras horas da manhã que nos acordam com uma brisa suave e fria, um terno convite para a primeira xícara de café do dia, que bebemos sem pressa, enquanto nos encantamos por quão baixa está a cerração que cobre as montanhas ao redor da nossa cidade. O alternar das estações do ano sempre foi uma riquíssima fonte de inspiração para os escritores de todo o mundo.

A atmosfera de cada uma delas atua sobre nossos humores e temperamento, funcionando ora como os impulsos que nos levam às sensações, ora como os espelhos que refletem nossos sentimentos.

Como escreveu o autor norueguês Jostein Gaarder: “Nos últimos tempos, muito se falou e escreveu sobre o Outono. (…) A natureza parece se dissolver. Nada se liga mais a nada. E meu coração parece não estar mais tão firme no peito. Neste momento, coço a casquinha de uma antiga ferida, descubro cuidadosamente a pele virgem – e eu mesmo sou um pouco outono.”

Stephen King, autor norte americano, lançou em 1982 um livro com quatro contos, cada um deles inspirado em uma das estações do ano. O conto intitulado “O Corpo”, inspirado no outono, foi adaptado para o cinema e o filme foi lançado com o título “Conta Comigo”. Já escrevi uma coluna sobre essa obra cinematográfica que revejo todo ano, sempre nos meses outonais. Gosto de tentar perceber e captar os sinais sutis, a ligação entre o que o autor sentia e pensava sobre essa estação do ano e o que o inspirou a escrever uma história sobre a perda da infância e o início da idade adulta. Durante minhas cenas preferidas, me pego pensando em como as filigranas de emoção foram transpostas das páginas do livro para a tela do cinema. Os longos silêncios, a presença marcante da natureza na história e a amizade imatura, porém sincera, entre os quatro meninos. Amizade essa que se dissolveu – assim como se desmancham as frutas maduras que não são colhidas – quando eles cresceram. Eu cresci assistindo a essa história, a ponto dela ter, também, moldado a minha percepção sobre a vida e as emoções que me perpassam, todos os anos, durante os meses de abril, maio e junho. O outono como perda da inocência – descrito por King – se tornou uma parte importantíssima de como observo o mundo e de como recebo os detalhes que me atravessam e me constroem.

Outra leitura de outono que me acompanha há quase vinte anos é o livro “A sociedade do anel”, de J.R.R Tolkien. Quando li a obra O Senhor dos Anéis pela primeira vez eu tinha 19 anos e, sem que isso tivesse sido planejado, comecei a ler o livro em março e terminei em junho de 2003. A saga criada por Tolkien teve um grande impacto sobre mim e sobre a minha vida e, depois daquela primeira leitura, nasceu essa necessidade que tenho de revisitar certos trechos da obra todos os anos, sempre no outono. Me preparo para reencontrar as mesmas páginas como quem se arruma para rever um grande amigo. Como quem refaz, depois de muitos anos, uma mesma rota de viagem. Inalteradas e com as mesmas palavras, aquelas páginas sempre me contam novidades e me mostram detalhes da paisagem que eu ainda não estava madura o suficiente para absorver, durante as leituras dos outonos do passado. Emoções e afetos que somente com o passar do tempo e com a minha própria maturação eu pude completamente experimentar.

Minhas leituras e filmes de outono são um amarelado auto-retrato anual da minha própria alternância de estações e gosto, especialmente, de quando me visto eu mesma de outono.

Sempre há tempo para criarmos ou retomarmos nossos ritos pessoais de observação do nosso próprio crescimento e da nossa habilidade de admiração contemplativa. Se o verão nos pede para irmos lá fora e sentirmos o sol e o mundo em nossa própria pele, a chegada do outono nos acalma os ânimos e os desejos e nos convida para ficarmos mais tempo dentro de nós mesmos. Mas não há motivos, ainda, para portas fechadas e janelas escondidas pelas cortinas; estamos aqui dentro, mas há tanto que se ver e se encantar com o lado de fora. Minha sugestão – com essa primeira coluna da nova estação – é que você leitor, também encontre e se permita costurar a si mesmo com palavras e linhas e páginas que reverberem o que significa o outono para você. Que você conheça o que outras mentes escreveram sobre essa estação. Que as páginas que te farão companhia sejam calorosas e receptivas – como as visitas que amamos receber para conversar, em dias de clima ameno e prosa boa. E que, ao chegar o inverno, você sinta uma pontada de saudade dos encontros que se proporcionou e deseje revisitá-los, sempre que desejar e sempre que for preciso. A natureza segue seus ritos em silêncio. Quando nos damos conta, ela já desabrochou as flores e já madurou os frutos.

Seremos mais sábios quando aprendermos com ela que a vida não segue em linha reta, mas é um alternar eterno e cíclico, que se repete todos os anos, mas que nem por isso deixa de nos surpreender.

É por isso que eu amo o outono, porque sei exatamente o que esperar dele e mesmo assim me espanto e me encanto, todos os anos, com sua chegada. E me despeço guardando na estante meus livros-amigos, na esperança do nosso próximo reencontro, quando chega o momento de sua partida.

Olivia Batista de Avelar. Professora de inglês, pós graduada em filosofia, apaixonada por cinema e escritora
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