O mês de junho é marcado por muitas festas religiosas, das quais uma é dedicada ao santo que comumente dizem ser “casamenteiro”, consolador das moças (e não tão moças) que sonham em encontrar o seu amor verdadeiro e um casamento próspero e feliz.
Cresci numa família de tradição católica e, na casa da minha avó Maria, havia um pequeno oratório com muitas imagens, terços lidíssimos, bem como quadros do papa e dos santos católicos. Desde pequena, sempre gostei dessa atmosfera “devoto-decorativa”, por assim dizer.
Eu era uma criança e com muitos porquês na cabeça. Uma vez, disparei à queima roupa: “Vó, por que esse homem tá de vestido marrom e com um neném no colo?” Essa era a minha visão literal do quadro. Era um quadro antigo, de fundo meio esverdeado, naqueles moldes em que parece uma fotografia. Mas é pintado à mão de forma primorosa, envolto a uma moldura de gesso, igualmente marrom. O “neném” era tão fofinho que parecia de propaganda de sabonete infantil. Eu criava diálogos imaginários entre os dois – coisas de criança.
Bom, voltando à minha pergunta, depois de gargalhar mais com os olhos do que com a boca, num sorriso discreto que ela tinha, explicou-me que era o Santo Antônio e a criança era o menino Jesus. Para minha avó, essa era a explicação suficiente – eu era uma menina, não precisava saber dessas coisas de casamento. Não ainda… Na minha inocência, ficava pensando que Santo Antônio teve muita sorte e deveria ser muito velho, já que conseguiu pegar o menino Jesus no colo. Apesar de não falarem isso na catequese, nunca mais esqueci.
Com o passar do tempo, também aprendi que o Santo Antônio do neném no colo era tido como casamenteiro. Soube da história de que muitas moças pobres contavam com ajuda dele para conseguir um bom casamento, naquela época. Fico me perguntando se fosse nos dias de hoje. Será que Fernando Antônio (sim esse era o nome de batismo dele) seria um desses “coach” de relacionamento? Terapeuta familiar para casais em crise? Como seria uma conversa entre Santo Antônio e Zygmunt Bauman, sobre os relacionamentos líquidos? Devaneios à parte, fato é que Santo Antônio ainda teria bastante trabalho.
Como boa moça católica, rezei ao santo e me casei muito cedo. Talvez, não tenho rezado o suficiente, pois me separei mais rápido ainda… (risos – está tudo bem!). Desde então, sigo num caminho sem marido, porém, não sem amor, não sem o Santo Antônio.
De tempos em tempos, muitas receitas e novenas me são oferecidas, com o objetivo de provocar o santo a me arrumar um marido; minha mãe pega o pão de Santo Antônio todos os anos na missa e me faz comer um pedaço; minhas amigas colocam o santo dentro do pote de arroz, de açúcar, no congelador, de cabeça para baixo. Eu mesma, confesso, já sequestrei o pobre menino Jesus da minha imagem de Santo Antônio. Podem rir, me julguem! Não adiantou muito. Fiquei com dó do menino Jesus e devolvi sem pedir resgate. Hoje, ambos ficam perto dos meus livros, para me lembrar que, se for para me arrumar alguém, que seja quem goste de livros. Se fôssemos analisar a fundo, temos aí uma relação um pouco tóxica com o pobre Santo… Mas isso é parte da devoção popular – está tudo certo!
Penso que o queremos, no fundo, é amar e sermos amados, ter com quem partilhar a vida, na alegria e na tristeza. Longe das relações líquidas e tóxicas, mas com o amor que é capaz de edificar o outro e construir relacionamentos sólidos, fora das fantasias de filmes e revistas. Sem dúvida nenhuma, apesar de Fernando Antônio de Bulhões nunca ter se casado, encontrou o amor verdadeiro numa vida dedicada a Deus e aos necessitados.
Esse fato, independente de devoção religiosa, acaba sendo uma fonte de inspiração que pode nos ajudar a transcender o desejo de encontrar a pessoa amada e colocar esse sentimento nobre e legítimo disponível em boas ações ao próximo. Quem sabe nesse caminho, Santo Antônio não dá aquela força?
Só para não perder o costume, segue abaixo a oração de Santo Antônio. Vai que…
Ó Santo Antônio, o mais gentil dos santos, teu amor a Deus e tua caridade com Suas criaturas, fizeram com que foste digno de possuir poderes miraculosos. Motivada(o) por este pensamento, peço-te que… (formular o pedido). Ó gentil e amoroso Santo Antônio, cujo coração estava sempre cheio de simpatia humana, sussurra minha súplica aos ouvidos do doce Menino Jesus, que adorava estar em teus braços. A gratidão do meu coração será sempre tua. Amém.