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Fiéis de religião de matriz africana se queixam de intolerância religiosa

foto perfil anete3
Anete Lacerda

Victor Luiz da Silva tem 34 anos. É contador, ético, sério e procura honrar seus compromissos, tem uma relação respeitosa com todas as pessoas, mesmo que não as conheça, respeita todas as religiões e é adepto dos cultos de matriz africana.

Mariana Barros (nome fictício), 32 anos, é advogada, igualmente ética, e além da rotina jurídica que precisa seguir no exercício da profissão, tem o olhar voltado aos atendimentos sociais, que presta através instituições e coletivos. É paganista.

Thatiane Cardoso, 32 anos, é engajada em movimentos sociais e na luta pela garantia de direitos e na defesa de mulheres vítimas de violência doméstica, escritora, produtora cultural, graduanda em Letras, representante da Cultura popular no Conselho Municipal de Políticas Culturais de Cachoeiro e candomblecista.

Jeremias Schaydegger é coreógrafo e bailarino respeitado, tem 59 anos e é umbandista. Além de ser conhecido pelos belos espetáculos que promove, é lembrado também por ter dado aulas de balé como voluntário durante mais de 15 anos num projeto social do Centro Espírita Maria de Nazaré.

Ainda como voluntário, iniciou em 2004 o projeto Gente, que leva a dança para crianças e adultos portadores de deficiência, e também para crianças em risco social.

É também apoiador do Projeto Mova-se, que trabalha pela mobilidade e acessibilidade em Cachoeiro, que atualmente é parceiro do Projeto Gente na realização dos espetáculos de dança, suspensos desde o início da pandemia.

Se você está se perguntando porque citar a religião dos entrevistados, quando isso geralmente não é feito quando a entrevista é com as pessoas cristãs, está na hora de tocar numa ferida que ainda assola a sociedade, em pleno Século XXI:  a intolerância religiosa (ou racismo religioso).

Todos os relatos dessa matéria mostram o quanto fieis das religiões de matriz africana, e as pessoas pagãs, como é o caso de Mariana, ainda são perseguidas e destratadas, e têm sua competência desconsiderada por aqueles que não conseguem conviver com a pluralidade religiosa. Algumas fotos não serão mostradas para preservar as pessoas, que preferem evitar constrangimento às famílias.

Mariana conta que já foi procurada por um potencial cliente que queria trocar o advogado que a assistia por ter descoberto que ele era candomblecista.

“Não havia queixas quanto à qualidade do serviço. Não houve qualquer má conduta por parte do profissional, ele seria “demitido” por algo que ele praticava na vida pessoal, e que não afetava em nada ao cliente”, enfatiza.

A advogada conta que obviamente declinou da solicitação de atendimento e recusou a cliente. Relata também de uma pessoa em situação de vulnerabilidade social que recusou a doação de alimentos porque vieram de um terreiro de Umbanda.

“Nos vídeos que me enviaram, a pessoa gritava, colérica, para levarem aqueles alimentos amaldiçoados dali, que Deus proveria a benção na vida dela”, destaca.

Com Victor Luiz também aconteceu algo inusitado. Explica que após prestarem atendimento a uma mulher (consulente, no termo exato) que os procurou relatando problemas de saúde do marido, fizeram a corrente mediúnica de quebra-demandas.

Ela relatou que o companheiro estava com sintomas depressivos decorrentes de perturbações mentais severas, como vozes, confusões, sonhos e visões, seguidas de grande cansaço, desânimo, aborrecimento e tristeza.

Para encurtar a história, uma semana depois do atendimento um dos irmãos do terreiro, preocupado com a falta de retorno da mulher, resolveu passar em sua padaria para ver como ela e o marido estavam.

Ele estava com as vestes características e foi enxotado pela mulher, como se não o conhecesse e nem tivesse recorrido aos serviços do terreiro.

Victor conta que ela disse que aquela padaria era um ambiente cristão, e que se retirasse dali, pois lá pessoas macumbeiras não eram bem-vindas.

Segundo ele, o dono da padaria, antes depressivo e acamado, estava tão saudável que ameaçou usar da força física para retirar o seu irmão de terreiro do estabelecimento.

“Apesar do momento constrangedor e desrespeitoso, o objetivo dos trabalhos que fizemos para ajudar aquela senhora foi perfeitamente alcançado, uma vez que a padaria estava funcionando após semanas sem operação, e o marido, a quem buscamos socorrer, estava bem”.

Em relação a Jeremias, todo esse comprometimento e dedicação pelo bem comum não o livraram de sofrer críticas, preconceito e discriminação em função da fé que escolheu, mas ele diz que não tem dificuldades em falar sobre assuntos polêmicos.

“Minhas escolhas não interferem em meu caráter. Só não vê quem não quer. Ou melhor, quem não me conhece e me julga sem conhecer”.

O coreógrafo destaca que um dos grandes erros do ser humano é julgar sem conhecimento de causa. Mais que julgar, diz ele, o ser humano sentencia, o que não sua visão é mais grave ainda.

“Somos sempre criticados pela ignorância alheia. As pessoas falam sem nunca ter conhecido ou vivenciado aquilo que criticam”.

Thatiane Cardoso ressalta que o racismo religioso é uma das muitas manifestações do racismo estrutural, direcionado às pessoas que estão inseridas nas crenças de matrizes africanas, e que independe de raça e cor.

“Sou uma mulher branca, candomblecista, que lido diariamente com racismo religioso. Que já ouviu de pessoas próximas que ‘não como nada que você faz, vai que você está fazendo macumba pra mim’ ”.

 

Caridade é o principal fundamento de religiões de matriz africana, diz adepto

 Victor Luiz diz que o comportamento da consulente que fez de conta que não os conhecia, aborreceu a todos do terreiro, que participaram de um ritual de mais de seis horas, para as práticas de livramento e desobsessão.

“São procedimentos com grande dispêndio energético, é extremamente nocivo aos indivíduos, que não raramente, padecem com tonturas, desmaios, enjoos, fraquezas, além de vulnerabilidade para os membros naquilo em que acreditamos sobre a espiritualidade”.

Apesar do aborrecimento, a orientação da matriarca do terreiro foi de que estavam ali para ajudar, e era isso que tinham feito.

“Ela falou que ajudar é um ato de amor, e que o amor não carece de reconhecimento. Que as pessoas respondem por si, e quanto a isso não há nada que possamos fazer além de orarmos por elas”.

 

Exclusão em nome da fé

 Mariana diz que a intolerância religiosa vem sempre disfarçada de opinião, de preocupação, e que o intolerante dificilmente assume que é intolerante. “Ele sempre tem uma desculpa “razoável” para os atos dele. Ele nunca assume seus preconceitos”, enfatiza.

A advogada diz que entende sua posição de privilégio, pois como pessoa não cristã, basta ficar em silêncio sobre sua fé para tudo ficar “bem”. Bem entre aspas, como faz questão de destacar.

Relata que mesmo assim já sofreu tentativas de conversão invasivas de completos estranhos, ou de pessoas “bem intencionadas”, que só estavam preocupadas com a  “salvação” dela.

“Enquanto isso, pessoas do meu convívio são hostilizadas das mais diversas maneiras. É doloroso. E cansativo tentar estabelecer qualquer via de diálogo racional. Na tentativa de preservar nossa saúde mental, por vezes, nos disfarçamos por aí. Não devia ser assim”.

 

 

 

Thatiane Cardoso destaca que o cerne dessas manifestações de intolerância, seja através do racismo estrutural dominante na sociedade, ou do racismo religioso, abarca e ataca qualquer pessoa que professe uma fé contrária à fé cristã.

Ela pontua que são atitudes de desrespeito, que causam dano emocional, e muitas vezes físico, a quem é vítima dessas ações.

“O racismo religioso é covarde e perigoso. É um câncer que precisa cirurgicamente (através do conhecimento e conscientização) ser extirpado da sociedade”.

ENTREVISTA: Jeremias Schaydegger

 

A Umbanda ama e respeita as pessoas, cultua e protege a natureza, diz Jeremias

 

 

Jeremias Schaydegger é presidente da Casa de Caridade Francisco de Assis, em Vargem Alta, e conversa conosco sobre o preconceito e intolerância em relação às religiões de matriz africana.

 

Fale da sua caminhada de fé

Jeremias Schaydegger: A religião que abracei com o meu coração é linda. Nasci em um lar cristão. Minha família praticamente toda é evangélica, Batista, de onde herdei princípios valorosos e que trago em minha formação espiritual.

A minha família, pilar sagrado, na minha opinião, sempre respeitou as minhas escolhas por saber quem eu sou. Ainda no início dos anos 80, depois de peregrinar por várias religiões visitando templos e suas liturgias, conheci o espiritismo e a doutrina de Kardec.

Lembro nitidamente uma vez na Associação Espírita Jerônimo Ribeiro, que frequentei por alguns anos. Antes da reunião começar, vi uma irmã bem vestida ao lado de outra irmã de origem muito simples. Ambas concentradas e amparadas pela fé e pelo amor de nosso Pai.

Ali comecei a entender as diferenças físicas, mas ao mesmo tempo a comunhão do Espírito. O objetivo de ambas era o mesmo. Não quero entrar em questionamentos e atitudes de membros de outras religiões, mas uma coisa que presenciei e nunca entendi foi a ostentação dentro das igrejas.

Pessoas que iam somente para mostrar roupa da moda. E o que é mais importante ficou pra fora da igreja, que é o coração aberto em agradecimentos e preces.

 

Como conheceu a Umbanda?

Com base na doutrina de Kardec, há 11 anos conheci a Umbanda através do convite de uma amiga. Naquele primeiro convite eu não fui porque não me senti preparado, mas no segundo fui sem titubear.

Chegando ao local, me deparei com um lugar simples onde poucas pessoas, cinco para ser exato, esperavam o início da reunião. As pessoas estavam em prece esperando. Uma música muito linda de elevação espiritual preparava a todos para o início.

Quando o líder espiritual, Sete Encruzilhadas, me chamou para me sentar à frente dele, segurou minhas mãos, olhou dentro dos meus olhos e disse que via muito sofrimento, mas ao mesmo tempo um amor enorme. Então foi amor à primeira vista.

E é bom esclarecer que a umbanda é uma religião brasileira, criada por uma entidade, o Caboclo Sete Encruzilhadas. Um médium membro de uma casa espírita Kardecista, “recebeu”( incorporou) essa entidade e foi proibido de se manifestar, pois a casa não permitiria a presença de entidades , segundo eles, inferiores.

Foi quando ele disse que a partir daquele dia seria criada a religião umbanda, que traz características de religiões de matriz africana, do cristianismo e do catolicismo.

 

Quais diferenças você apontaria entre a umbanda e as religiões cristãs?

A umbanda é uma religião sem preconceitos. Todos são aceitos. Não julgamos ninguém. Todos vestimos branco e temos os pés no chão para lembrar que todos somos iguais. Numa casa séria de umbanda se pratica a caridade sem nenhum ônus. Não se paga nada. Acolhemos todos sem distinção, como fez Jesus Cristo, sincretizado na Umbanda como Oxalá. Eu e todos os umbandistas temos o amor como ingrediente principal de nossos trabalhos. Bons pensamentos e boas atitudes também são requisitos para a nossa caminhada.

E a umbanda ensina( sugere) também aos consulentes o exercício da fé. As entidades fazem 50%. Os outros 50% são os consulentes, a partir de obedecer os conselhos dados  e outras orientações, que têm que fazer.

Então é bom reforçar.  A umbanda não cobra por nada. A umbanda não faz nenhum trabalho para o mal. Ela desfaz. A umbanda não faz matança de animais. Não faz amarrações e trabalhos afins.

A umbanda trabalha, cultua e protege a força e a sabedoria da natureza. As águas doces, cachoeiras, o mar, as matas e as florestas, são alguns exemplos de elementos usados na cura de nossos assistidos. Unidos à fé de todos. Encarnados, Encantados , Entidades e os Orixás sagrados.

 

Vamos falar de intolerância religiosa?

Ela existe, e vemos isso até quando procuramos um lugar para fazermos nossos cultos. Por alguns anos nos reunimos no meio da mata, pois fomos convidados a nos retirar de vários locais por incompreensão das pessoas.

Então um amigo permitiu que nós fizéssemos as reuniões na propriedade da família dele. Mas após uns três anos, fomos novamente convidados a nos retirar por conta dos outros membros da família, que não concordavam com as nossas reuniões.

Naquele dia choveu muito, mas fizemos a reunião a céu aberto assim mesmo. Cristo também não tinha teto quando evangelizou. Foi quando uma amiga de corrente ofereceu sua casinha para colocarmos o material. Nessa casinha começamos a nos reunir e estamos até hoje.

Com uma vitória: estamos construindo nossa casa. Já batemos a terceira laje e andamos com a obra. Fruto do esforço dos membros da casa. Como disse não cobramos um centavo de quem procura ajuda em nossas reuniões. E vamos finalizar a obra com a fé em nosso Pai Maior.

 

Quais os desafios de todo dia?

É continuar exercitando a nossa fé e fazendo o bem. Enquanto alguns líderes religiosos difamam nossos cultos e nossas entidades espirituais de trabalho, somos cada vez mais agraciados pelos resultados apresentados em cada reunião.

Pessoas que bebiam há mais de 40 anos hoje não colocam uma gota de álcool na boca. Pessoas com depressão que hoje não tomam nenhum comprimido. E casos e casos de êxito surpreendentes. Como disse, a umbanda não recrimina nenhuma outra religião. Não perdemos tempo falando mal, pois o que aprendemos é o respeito ao próximo. E a trabalhar pela nossa evolução moral, a nossa reforma íntima.

Hoje contamos com mais de 40 membros no corpo mediúnico. Irmãos abnegados que abraçaram o trabalho de caridade, com amor e entrega. Em nossas reuniões sempre aparecem irmãos à procura de um alento, seja ele emocional, físico ou espiritual. Estamos nos firmando como uma casa que, aos poucos, se especializa em trabalhos de desobsessão e cura.

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