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Histórias que meus avós contavam

escritoras-cachoeirenses2-07-01-23
Escritoras Cachoeirenses

Quem nunca dormiu ouvindo histórias dos mais velhos? Hoje, me pego, às vezes, analisando a vida do meu avô Caboco. Fico horas e horas pensando o quanto ele sofreu para que eu hoje possa usufruir de uma vida digna e saudável. Quantas noites de sono foram perdidas por ele? Recordo a fala da minha mãe, contando que um dia ouviu seu pai dizer “um dia hei de ver meus filhos comendo arroz e feijão todos os dias”, recordo todos os esforços realizados por ele para que eu pudesse chegar onde estou.

Mas, no dia de hoje, não posso esquecer a forma como meu avô me educava, através de suas histórias bizarras, mentirosas, mas educativas e encantadoras, que me prendiam quando ouvia seus causos. Citarei adiante sua história mais famosa, quando, segundo ele, matou uma bruxa.

Quando criança, Josias recebeu o apelido de Caboco ou Caboquinho. Vivia em uma localidade do interior da cidade, um lugarejo que frequentemente era visitado por um ser misterioso que acreditavam ser uma bruxa. Dizia-se que essa bruxa, nas noites de lua cheia, aterrorizava a comunidade com o som de sua risada e os ventos produzidos por suas asas.

Caboco sempre prometera aos vizinhos que seria ele quem mataria a bruxa e aguardava a oportunidade certa para fazê-lo. Numa noite, quando seu filho mais novo completava um mês de nascido, o primeiro sinal que percebeu foi o vento forte causado pela batida das asas e, junto com ele, o barulho de uma risada que vinha aumentando.

Em sua casa, de modelo antigo, a cozinha era mais baixa que o restante da residência, assim, o telhado ficava a meio metro de distância da casa, o que possibilitava ver claramente o céu noturno. Naquela noite, meu avô viu, pela abertura da casa, quando esse ser misterioso pousou nas telhas. Imediatamente, se preparou para cumprir sua promessa, pegando sua espingarda e mirando no peito. Ao efetuar o disparo, ouviu sua risada sendo trocada por um som de desespero, e sentiu o vento das asas batendo pela última vez. Ao amanhecer, os vizinhos logo lhe procuraram para contar que ouviram ele acertar o tiro, e nunca mais se viu ou ouviu tal monstro, em toda a região.

Os que acreditam nessa história, alegam que hoje já não existem mais seres como esse, pois as pessoas rezam mais. Não sei se foi verdade ou não, mas de uma coisa temos que ter certeza: a importância de se valorizar os relatos contados por nossos mais velhos. Não seríamos nada sem a força dos nossos ancestrais.

Dandara Dias. Mulher, negra, filha de lavradores, professora e historiadora. Descobriu-se negra tardiamente, devido ao racismo estrutural em nossa sociedade, e atua como avista antirracista desde sua formação como docente, aos 21 anos. Desde então, está na luta por um lugar de fala. Encontrou-se escritora aos 28 anos, após retratar suas lutas através da escrita. Além disso, é artista, agente cultural, ambientalista, feminista e educadora social.

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