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Que horas ela volta? – sobre as empregadas domésticas e o Brasil escravocrata

olivia-15-08-2023
Olivia Batista de Avelar

Valdirene, carinhosamente chamada de Val, é uma mulher nordestina, de origem pobre, que deixa sua cidade natal e se muda para São Paulo à procura de trabalho. Sem a certeza de emprego e moradia, ela deixa para trás, aos cuidados de seu pai, sua filha pequena, chamada Jéssica. Val consegue um emprego de babá na capital paulista – e passa a tomar conta do filho de um casal de classe média alta e, também, a ser a empregada da casa. Durante mais de uma década, Val se dedica a esse trabalho e sua moradia é o quarto de empregada na casa da família para quem trabalha. Enquanto sua própria filha crescia, Val se dedicava a cuidar do filho de seus patrões – e enviava parte de seu salário para o sustento de Jéssica, com quem ela teve quase nenhum contato e que não pode criar diretamente.

A história de Valdirene é uma das mais comuns entre mulheres pobres do Brasil.

Com certeza, você conhece uma – ou mais mulheres – que vivem, ou viveram, essa mesma rotina. E, infelizmente, certamente também já ouviu alguém dizer que ter uma empregada doméstica “que é praticamente da família” é um ato de bondade e que esses empregadores estão oferecendo, gentilmente, uma vaga de trabalho para alguma menina pobre ou senhora sem recursos que, de outra forma, não teria oportunidade de trabalhar. Acontece que, quando olhamos com atenção para a formação social e econômica de nosso país, percebemos que a situação é exatamente inversa e, partindo da história de vida de Valdirene, é muito importante entendermos o porquê dessa situação existir e também como essa distorção funciona.

Val é a personagem principal do filme Que horas ela volta? – 2015, disponível na Globoplay. Foi brilhantemente interpretada por Regina Casé – mas o rosto de Val é a face de grande parte das mulheres brasileiras. É preciso entender que, além da hierarquia social que existe entre homens e mulheres – com relação ao acesso à educação, ao mercado de trabalho, aos salários iguais, aos cuidados gratuitos de saúde reprodutiva – existe, ao mesmo tempo, uma hierarquia que posiciona socialmente as mulheres brancas, de classe média alta, com diploma e profissão e moradoras da área urbana acima das mulheres pretas, pobres, com pouca ou nenhuma instrução e que residem em zona rural ou na periferia das cidades.

Essa separação entre “patroa e empregada” é uma herança cruel da escravidão – o Brasil é um dos poucos países do mundo onde as casas ainda mantém em sua arquitetura o humilhante “quarto de empregada” – ou, para ser mais incisiva no que essa nossa realidade representa, essa “senzala moderna”.

Ter uma empregada doméstica não é uma postura da sociedade brasileira que “ajuda” mulheres que não teriam emprego de outra forma, mas sim uma das principais características sócio-econômicas que perpetua essa divisão social injusta e desigual que herdamos do nosso longo período escravocrata. Muitas trabalhadoras domésticas tiveram mães e avós que desempenharam a mesma função e, voltando ainda mais no passado, também tiveram bisavós escravas. O trabalho doméstico de mulheres é uma das principais causas do trabalho infantil – pois, na ausência da mãe, na grande maioria dos casos o cuidado da casa e dos irmãos recai sobre as filhas dessas trabalhadoras e, também, são essas meninas que, pela necessidade de complementar a renda familiar, também começam a exercer a mesma função ainda muito cedo e, dessa forma, abandonam ou não se dedicam unicamente aos estudos.

É muito importante lembrar que, segundo dados e pesquisas do IBGE, quase metade dos lares brasileiros são sustentados por mulheres sem presença ou ajuda financeira do pai.

O trabalho doméstico, no Brasil, é mal remunerado e estigmatizado – apenas em 2013 foi aprovada uma lei, que só entrou em vigor em 2015 – assegurando direitos trabalhistas para essa categoria de trabalhadoras. Em 2016, o Brasil tinha 6,158 milhões de trabalhadoras(es) domésticas(os), dos quais 92% eram mulheres. Para a empregada doméstica, ainda hoje, é comum observarmos “pagamentos” feitos com roupas e calçados usados da família, utensílios domésticos descartados pelos patrões, alimentos ou qualquer outro tipo de bens que são vistos – ainda e por muita gente – como “presentes” e “regalias” para essas mulheres. Pare e se pergunte: que médico trabalha por uma camisa usada? Que advogado recebe um saco de arroz aberto como complemento de seus honorários? Que dono de loja aceita móveis usados como pagamento por seus produtos?

Nós somos uma sociedade que normaliza a humilhação da mulher, que aceita que seu trabalho vale menos e que deve ser executado por “amor” e “com o coração” e não por um salário justo.

E, acima de tudo, essa é uma hierarquia e uma opressão sorrateira e disfarçada de benevolência e carinho que vem das próprias mulheres/patroas e que só indiretamente é influenciada pelos homens.

Quando atuamos para defender os direitos das mulheres e para atacar os poderes que nos oprimem é muito necessário entendermos que as amarras e violências sociais/políticas/econômicas recaem sobre as mulheres de formas diferentes e que, sim, algumas carregam muito mais peso e violência sobre seus corpos do que outras. Quantas Valdirenes você conhece? Quantas você já empregou? Quantas você escuta? Quantas você enxerga como igual?

O Brasil veio da senzala e uma luta justa por direitos para todas as mulheres precisa olhar e levar em conta, principalmente, aquelas mulheres que ainda moram e que ainda acreditam que seu único lugar na sociedade é o quarto da empregada.

 

Olivia Batista de Avelar. Professora de inglês, pós graduada em filosofia, apaixonada por cinema e escritora
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