“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantar os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.” Rui Barbosa.
Estamos diante de um impasse, Rui Barbosa, com referida competência, analisa atitudes humanas em um passado longínquo e, hoje, temos como reflexos na vida hodierna. Apropriou-se do verbo ver, e este remete a sentimentos, consegue ver quem analisa com o coração, com sentimentos. Já dizia Antoine de Saint Exupéry, “O essencial é invisível para os olhos”, “Só se vê bem com o coração.” Por um lado a tristeza que toma conta do ser humano e por outro, o desânimo, a ironia e a vergonha.
Se considerarmos os contextos nos quais estamos inseridos, também teríamos motivos bastantes para agir tal qual o texto citado. É evidente que a pessoa que incorporou valores pode até apresentar algum momento de fraqueza, mas a fidelidade a seus valores e princípios, certamente, prevalecerá.
Diariamente, somos bombardeados com uma série de informações que podem até mesmo nos desestruturar, nos desestabilizar e nos jogar para escanteio. E essas informações são como uma bola de neve sempre vão crescendo, aumentando o leque e engrossando as fileiras de nossa imaginação, contribuindo de uma certa forma para perturbações e transtornos mentais, gerando uma grande inquietação que requer mudanças.
Destaco aqui as últimas do bombardeio midiático eletrônico e também o impresso. Com tristeza, o trivial ainda é a Pandemia do novo Coronavírus que tem ceifado vidas pelo mundo a fora. Atrelada a ela, não menos comentada cotidianamente a questão da vacina no combate a essa doença. Os desmandos bem domésticos por assim dizer constituídos das falcatruas; a novela Lavajato; Improbidade Administrativa; a falta de idoneidade moral de alguns representantes do país; a mendicância; a fome e a miséria. Estas últimas mais acentuadas, ainda, devido à Pandemia. Abro um parênteses para mostrar a importância e a relação da Literatura com o nosso cotidiano. Em 27 de dezembro de 1947, Manuel Bandeira, poeta pernambucano, visualizou um cenário deprimente de um ser que chega a uma situação mais abjeta que se possa imaginar. Bandeira nos deixou para análise o poema “O Bicho”: “Vi ontem um bicho/ Na imundície do pátio/ Catando comida entre os detritos/ Quando achava alguma coisa/ Não examinava nem cheirava/ Engolia com voracidade/ O bicho não era um cão/ não era um gato/ não era um rato/ O bicho, meu Deus, era um homem.” Mais uma vez se faz valer o questionamento: “a vida imita a arte ou a arte imita a vida?” Há mais de meio século, ou melhor, há sete décadas, o poeta, nesse texto, denuncia o abismo social. E, hoje, não está diferente. Fazendo-se um paralelo, temos ante nossos olhos as consequências dessa Pandemia que geraram o desemprego; falência de empresas; despejo de moradores que estavam instalados em residências, levando-os a serem moradores de rua; enfim as grandes mazelas da sociedade, as dores do mundo.
Não quero passar a batata para a mão de ninguém, nem enumerar ou nomear culpados pelos caos que se instalou, não é esse o objetivo. Apenas emito um juízo de valor. Podemos fazer uma reflexão com base no nosso papel de cidadão. Urge que se faça um saneamento no Brasil. Mas para isso é preciso redesenhar a vida em todos os sentidos. É possível? Um dos verbos mais utilizados ultimamente tem sido o verbo ressignificar. Pois é, Rui Barbosa nos faz visualizar atitudes decorrentes de negativismos capazes de contribuir para com o desânimo e a descrença de algumas pessoas.
Contudo, ainda, pode-se reverter o quadro caótico instalado. Não sugiro nada, apenas quero lembrar a cada brasileiro que cada um deve procurar ressignificar sua vida, redesenhando-a, literalmente falando. Não apenas dando outro significado, ou dando outro sentido. E, sim, reagindo ao sistema sem ódio, sem mágoas, sem estardalhaço; mas, naturalmente sem afetação.
Agora, parodio John Lennon, o beatle, “sou um sonhador, mas não sou o único”. E concordo com Anne Frank: “Apesar de tudo, creio na bondade humana.”