O filme “soul” demonstra o peso e a importância da busca pelo propósito de vida, além da automática tentativa de materializar ou sistematizar nossas emoções de acordo com o que julgamos ser o ápice da realização. Contudo, essa transmutação das ideias e dos sentimentos são influenciáveis, tornando-nos, geralmente, inaptos às percepções sutis dos pequenos êxtases ordinários.
Ao nascermos o nosso cronômetro é acionado, a bússola é disposta, e a chegada vislumbrada por aqueles que testemunham o nosso primeiro respiro, e o propósito de vida começam a ser desenhados pelo meio, pelo tempo, pelas pessoas e pelos sonhos alheios, ou próprios; ajustando as disposições das possibilidades em uma única aposta visando a conquista da probabilidade desejada.
A vontade de alcançar ou encontrar aquilo que vai nos fazer felizes e realizados – o motivo de estarmos vivos, afasta a solução mais básica que é: viver, e adiamos a ação mais natural na esperança de alcançar aquela promoção, aquele sonho que vai dar um toque especial a nossa existência; deixando o brilho dos pequenos momentos, do presente serem ofuscados por algo incerto ou até mesmo inexistente.
Se somos seres vivos, o que é mais lógico do que viver? Viver cada momento, cada escolha, cada sorriso, cada tristeza, cada esperança, conquistas e falhas. Viver não se limita à felicidade, está emaranhado ao caldeirão de sentimentos, pessoas e a complexidade do universo. As fagulhas da vida, prova de que estamos vivos estão presentes a cada segundo de nossa existência, mas cabe a nós percebermos a singularidade e a sutileza dos sinais de que tanto pedimos, e oramos.
Estar vivo – está ligado ao fato de sentirmos, presenciarmos, e abraçarmos os momentos, e a experiência da vida, depende de como reagimos às oportunidades que nos são apresentadas desde o acordar ao desanimar, desde o envelhecer ao se enfurecer.
A alma pode estar presente em cada detalhe do que vemos, tocamos, e desejamos, mas mais que isso – ela é sentida e vista de diferentes formas, incorporada por momentos que nos sintonizam e despertam os arrepios e as borboletas no estômago.
O sistema respiratório, sanguíneo, as estações do ano, as fases da lua, a terra, o ciclo da vida, são sintetizados, os princípios básicos da vida que nos rodeiam são racionalizados ao ponto de esquecermos de que, até mesmo, o meio em que somos inseridos – espaço/tempo – é cíclico, e o início, meio e fim são coexistentes e se retroalimentam.
Somos cíclicos, mas com o passar dos anos o racional tensiona a linha imaginária horizontalmente direcionando a um destino turvo e distinto, expõe e dispõe do mundo que o alcance, a felicidade, e o propósito de vida só há um. Contudo, determinando ou não uma meta, somos passíveis de sermos afligidos e, involuntariamente, levantarmos o impostor que passa reinar nossas vidas, emanando o mantra que mais assusta e causa frustração, já que é o – eu – vestido das roupagens autodestrutivas.
Assim, ocorre a perda do tempo e da energia na construção do impostor que passa a guiar as nossas vidas. E com o passar das estações, das chuvas, dos questionamentos, as nuvens só aumentam e alimentam o monstro da autodestruição, que nos diminui a cada conquista de pequenos desejos, momentos e encontros, que passam a ser irrelevantes.
Por que tudo o que fazemos tem que ter um propósito? Qual é a definição de propósito? Não basta a justificativa de que gostamos de algo?
Observe-se, e reflita se o que você alimenta é o seu impostor ou a sua alma.