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Frida

OLIVIA BATISTA DE AVELAR. Sob o céu noturno de 23 de Março de 2003, céu que florescia em fogo, Caetano Veloso apresentou a canção tema da cinebiografia da pintora Frida Kahlo

Sob o céu noturno de 23 de Março de 2003, céu que florescia em fogo, Caetano Veloso apresentou a canção tema da cinebiografia da pintora Frida Kahlo na cerimônia do Oscar. Cantando “Burn it Blue”, acompanhado da cantora mexicana Lila Downs, vestido de preto em um palco tingido de um azul vibrante como as cores das obras de Frida.

Eu assisti à performance de casa, pela televisão. Eram outros tempos e era, também, um outro Brasil – quando nossos horizontes e perspectivas coincidiam muito mais com o azul cantado na música do que nos dias de hoje.

Foi nesse dia que conheci, primeiramente, a música do filme. Uma letra que fala de fogo e de casas que se incendeiam, dentro da noite. De asas e mulheres quebradas pela vida e salvas pela redenção da arte – não sem antes serem batizadas pelo calor da cama e pelo frio das tragédias. Foi essa a canção que me levou ao filme. Foi essa a melodia que me levou à Frida. Antes de ver e conhecer, na tela, sua vida e sua pintura, imaginei quem ela era e o que eram seus quadros pelas palavras na letra da música, pela emoção do cantar de Lila Downs e pela voz de Caetano Veloso.

Essa é a força de Frida Kahlo: mesmo sem vê-la, sua presença potente se impõe por outros caminhos e nuances, basta a menção indireta e meramente sugerida de suas criações oníricas e inesquecíveis – não se esquece, confunde ou ignora um quadro seu. Quando Frida toca nossas retinas, ela fica. E nos modifica.

Frida – filme de 2002 dirigido por Julie Taymor e disponível na Claro Vídeo – conta a história da pintora mexicana, nascida em 06 de julho de 1907, a partir de sua adolescência e do trágico acontecimento que, anos mais tarde, seria tão visceralmente incorporado às figuras em seus quadros: Quando tinha 18 anos, em 17 de setembro de 1925, Frida voltava da escola para casa quando o ônibus em que estava colidiu com um bonde. Várias pessoas morreram, e a artista sofreu ferimentos quase fatais depois que um corrimão de ferro perfurou sua pélvis, fraturando o osso. Ela também fraturou várias costelas, as pernas e a clavícula. Foi durante o período de recuperação que, por estar confinada durante tantos meses a uma cama, ela foi incentivada pelo pai a começar a pintar, como forma de alívio e de autoexpressão. A arte de Frida nasceu da dor e, apesar de, recentemente, o rosto da pintora estampar tantos produtos e ser tão amplamente difundido com objetivos comerciais, infelizmente, o legado e o impacto de suas pinturas é, via de regra, encoberto e esquecido.

A vida de Frida não cabe em um filme. Ou vários. Ou em uma biografia, mesmo uma que se propusesse a debruçar sobre minúcias – como os nomes das cores de suas tintas, os selos colados em suas cartas, ou o formato da marca deixada por seus lábios nos copos de bebida, ou quais os tecidos foram costurados para fazer suas saias, lençóis, toalhas de mesa e ataduras. Frida será sempre maior que tudo isso. Frida nos escapa. Para onde quer que olhemos, ela não estará lá por inteiro. Estará, apenas, o que conseguimos alcançar dela – e isso será, sempre, muito pouco.

O que quero dizer com isso? Quero dizer que assistir ao filme que conta sua história é um começo, um ponto de partida. Quero dizer que ler sobre os fatos marcantes de sua vida: seus amores, seus amantes, suas viagens, sua atuação política, suas contradições – será sempre só um caminho, nunca um ponto de chegada e conclusão.

Quero dizer que contemplar seus vários rostos em seus quadros nos facilitará a acessar nossa própria dor, nossa própria doença, nossas artérias expostas e nossa paulatina decomposição, mas que nunca acessaremos a dor de Frida, pois essa foi só dela e de ninguém mais.

Porém e, sobretudo, essa mulher que não está completamente nas obras que contam sua história e que pode ser vista somente de relance em suas próprias pinturas – visto que toda obra de arte funciona mais como um espelho e não tanto como um buraco de fechadura – existe uma certeza que afirmo: definitivamente, não é nas canecas, nas almofadas, nas capas de caderno e nas estampas de camiseta que exibem seu rosto retocado e embelezado e modernizado que encontraremos Frida.

Tudo vira mercadoria, não me proponho a levantar os punhos contra a reza/cantilena do mercado. Mas ouso, aqui, dizer o que penso: não se pode comprar Frida Kahlo – não o fizeram em vida, não o farão após sua morte. Essa mulher nas imagens não é ela. Essa mulher nas imagens é só um produto.

Essa mulher nas imagens somos nós – eu, você, todos nós – comprados e vendidos feito artigos de feira pelos detentores do capital. Essa mulher é nosso vazio de arte. Essa mulher é qualquer um e qualquer coisa – menos Frida.

Olivia Batista de Avelar. Professora de inglês, pós graduada em filosofia, apaixonada por cinema e escritora

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