O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) autorizou a concessão à iniciativa privada de duas florestas nacionais localizadas no estado do Amazonas. No total, as duas áreas liberadas para concessão possuem o tamanho equivalente a 715 mil campos de futebol.
A Gleba Castanho e a Floresta Nacional de Balata-Tufari foram qualificadas no âmbito do Programa de Parcerias de Investimento (PPI), ainda sob a gestão do governo Jair Bolsonaro. Com isso, foi autorizada a publicação dos editais de licitação de ambas as florestas.
Por meio da concessão florestal, o governo concede à iniciativa privada por 40 anos a gestão de uma determinada área ambiental, permitindo a sua exploração sustentável. Em contrapartida, a empresa que vence a licitação paga uma compensação ao poder público pela concessão da floresta.
A Gleba Castanho é uma Unidade de Manejo Florestal (UMF) localizada nos municípios amazonenses de Careiro, Manaquiri e Beruri. A unidade possui cerca de 240 mil hectares, dos quais 151 mil hectares serão destinados à concessão.
Já a Floresta Nacional de Balata-Tufari fica no interflúvio dos rios Madeira e Purus, próxima aos municípios de Humaitá, Tapauá, Lábrea e Canutama, também no Amazonas. Ela tem uma área de 1,1 milhão de hectares, dos quais 564 mil podem ser destinados ao manejo.
Exploração
Segundo o advogado Gabriel Machado Sampaio, especialista em direito ambiental e sócio do Aroeira Salles Advogados, a concessão de florestas públicas teve suas regras definidas na Lei 11.284/2006, na primeira gestão do governo Lula.
Ele explica que as concessões florestais estão concentradas na Amazônia e que a permissão para exploração dos recursos naturais dessas áreas deve obedecer limites impostos nos contratos com o poder público.
“Essas florestas públicas podem estar sujeitas à gestão por particulares sem que a área da floresta deixe de ser pública, mas isso é permitido com objetivo de possibilitar a renda ou a exploração comercial que não seja nociva ao meio ambiente. Não significa uma autorização para corte da floresta. É previsto o corte de áreas restritas, com replantio de espécies naturais e o aproveitamento de subprodutos, até algumas questões de turismo também local. O concessionário pode explorar as madeiras e subprodutos, como o como látex, a castanha”, afirma.
De acordo com o Serviço Florestal Brasileiro, órgão ligado ao Mapa, o objetivo da concessão florestal é promover o manejo florestal sustentável, com técnicas de exploração de baixo impacto para o meio ambiente. Além disso, espera-se que as concessões contribuam para a manutenção da biodiversidade local. O advogado Gabriel Machado Sampaio acredita que concessões bem planejadas e com objetivos claros podem ajudar a reduzir a pressão pela exploração ilegal do bioma.
“Com controle, a partir de ações com critérios sérios, você possa selecionar interessados que possam explorar de forma sustentável a floresta e, assim, contar com uma uma maior gama de usuários dos recursos naturais, que estarão com uma intenção de uso legal, e isso acaba afastando, naturalmente, ou, assim se espera, o uso ilegal”, avalia.
O órgão também afirma que as concessões florestais servem de contraponto às práticas de exploração irregular de madeira, ajudando a diminuir a grilagem em terras públicas e a coibir as ações criminosas de queimadas e furto de madeira.
Os contratos firmados entre o poder público e as empresas que administram as florestas públicas preveem a geração de empregos indiretos e diretos para as populações que vivem nesses municípios, seja na extração dos recursos naturais para a produção de bens, no transporte desses produtos até os municípios ou no turismo florestal.
“Não existe uma rede logística muito forte na Amazônia [por exemplo]. Se você faz o corte de uma árvore, você vai, por consequência, fazer o desdobro dela dentro da própria floresta, o que necessita de mão de obra local. E dependendo do tamanho da área concedida, do volume de madeira que é extraída, podem surgir miniempresas ali dentro; tanto diretas, em função da própria concessão, quanto indiretas”, explica o especialista Charles Dayler.
Arrecadação
Os concessionários devem fazer pagamentos trimestrais ao Serviço Florestal Brasileiro, referentes à exploração de madeira e demais produtos florestais. No momento da assinatura do contrato, calcula-se o Valor de Referência do Contrato (VRC).
O VRC é uma estimativa do valor da produção anual para a área concedida e tem como base o preço da proposta vencedora. O VRC é utilizado como referência para calcular o Valor Mínimo Anual (VMA) que, como o próprio nome indica, representa o montante mínimo a ser pago pelo concessionário ao Serviço Florestal Brasileiro – mesmo que não haja produção naquele ano.
Todo valor que excede o VMA (chamado de “demais valores”) é destinado à distribuição entre os estados e municípios onde estão localizados os lotes de concessão florestal, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Em 2022, a arrecadação por meio de concessões florestais federais chegou aos R$ 32,8 milhões, cerca de 13,6% a mais do que em 2021, quando o montante foi de R$ 28,8 milhões.
Os estados onde estão localizadas as concessões partilharam R$ 4.268.878,14, mesmo valor que os municípios dividiram.
Mudanças
A Câmara dos Deputados analisa um projeto de lei que flexibiliza o modelo de licitação e os contratos para concessão de florestas públicas. O texto altera a Lei de Gestão de Florestas Públicas (11.284/2006). De acordo com o Serviço Florestal Brasileiro, até 2021, o país tinha 311,6 milhões de hectares de florestas, dos quais 19 milhões atendiam aos critérios para concessão à iniciativa privada, mas apenas 1 milhão estavam concedidos.
O ex-deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) e os demais autores do PL 5518/2020 acreditam na ideia de desburocratizar o processo de concessão para atrair mais investidores para essas áreas. Uma das sugestões é inverter as fases de habilitação e julgamento nas licitações, para que só seja preciso avaliar a documentação das propostas classificadas na fase de análise técnica.
O projeto de lei também prevê que os contratos sejam revistos depois da elaboração do plano de manejo florestal e a cada cinco anos, para reequilíbrio econômico-financeiro, considerando a produtividade real. O texto amplia a permissão para a comercialização de créditos de carbono e outros serviços ambientais, dando às empresas mais possibilidades de arrecadar além das opções que já existem.
O deputado federal Coronel Chrisóstomo (PL-RO), relator da matéria na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS), afirma que o PL aumenta a atratividade das concessões florestais.
“O que muitos concessionários querem não é nem madeira, que passa a ser até secundária. Muitos querem aquilo que existe dentro da floresta. Tem o crédito de carbono que também pode ser comercializado dentro do processo de concessão florestal e a comercialização de outros serviços ambientais, como o patrimônio genético, a conservação, pesquisa e desenvolvimento da bioprospecção”, destaca.
A proposta também elimina o VMA e a obrigatoriedade de o concessionário ressarcir o poder público pelos custos da licitação. O PL já foi aprovado na CMADS e, agora, aguarda votação no Plenário da Câmara dos Deputados.
FONTE: BRASIL 61