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Quem são as loucas?

olivia-15-08-2023
Olivia Batista de Avelar

“Eu estava com saúde
Adoeci
Eu não ia adoecer sozinha não
Mas eu estava com saúde
Estava com muita saúde
Me adoeceram
Me internaram no hospital
E me deixaram internada
E agora eu vivo no hospital como doente
O hospital parece uma casa
O hospital é um hospital”
Stella do Patrocínio

Ontem, dia três de junho de 2023, conduzi um Workshop preparado para a inauguração da Casa Carmô, novo espaço cultural de Cachoeiro de Itapemirim. Na companhia das psicólogas Marina Balarini – que estreará, em breve, na Coluna Secreta Luz, contribuindo com textos de sua área de atuação – e Laís Scarpe, nos debruçamos sobre o tema “Mulheres, Loucura e a Luta Antimanicomial”.

Buscando construir um elo com esse assunto tão relevante, encontrei nas artes exemplos e nuances de uma história marcada pelo sofrimento, porém imortalizada através da beleza das pinturas, da força da literatura e do incômodo social causado pelos filmes.

Em 2020, quando participava do 3×4 Filmes – 3 Filmes por Semana, 4 Amigas Juntas – dedicamos uma das 20 semanas de duração do projeto a filmes que retratavam a loucura. Na época, escrevi um ensaio sobre as três obras que assistimos, texto que revisitei durante os estudos para a roda de conversa de ontem.

Há uma diferença marcadamente dolorida entre pensarmos a loucura humana e perscrutarmos especificamente as mulheres consideradas loucas.

Entre as muitas passagens angustiantes dos artigos que li, quando me preparava para o evento, uma delas me surpreendeu quando, na verdade, talvez não devesse: “a melancolia e os estados psíquicos alterados dos homens, tantas vezes associados à genialidade, à profundidade filosófica e à capacidade criativa, quando acometiam as mulheres eram repetidamente tratadas como histeria, possessão demoníaca, bruxaria e perversão sexual”, em menção livre ao texto original, publicado em língua inglesa. Há três anos, pensamos e debatemos sobre a loucura sem sexo, a loucura humana como se ela fosse vista e tratada de forma igualitária, apartada da realidade material que hierarquiza, segrega, diagnostica e trata os corpos femininos por sua subalterna capacidade reprodutiva. É em face dessa reformulada e mais apurada percepção que transcrevo, abaixo, o reescrito ensaio publicado há três anos e que agora se entitula “Quem são as loucas?”

Com o que sonham as loucas? O que desejam e quem desejam? Como sentem o nascer do sol tocar os pelos de sua pele, de manhã? De quem se lembram, quando cai a chuva de verão e o vapor molhado e elétrico dos relâmpagos se misturam à sensação de que não vivemos a vida como gostaríamos? Como deveríamos? Por quem suspiram, quando levantam os olhos antes de dormir, e se sentem tão sozinhas enquanto assistem, caladas, ao teatro das constelações e à vigília das estrelas?

As loucas já foram musas de artistas renomados e seus corpos estampam pinturas famosas, retratos pelos quais nunca foram pagas ou receberam os devidos créditos. Suas mãos já esculpiram estátuas que foram assinadas por seus professores e amantes – consumidas pela paixão, entregaram seu talento em troca do amor não correspondido. Ao parirem filhos bastardos, frutos de estupros ou de relações com homens casados, foram encarceradas em manicômios para não sujarem a honra dos pais de família. Ao sucumbirem à tristeza por não serem boas mães, boas filhas, boas cristãs, boníssimas almas, foram lobotomizadas e eletrocutadas para aprenderem a cooperar, a se comportar, a obedecer. Quando denunciavam seus agressores, foram assassinadas por não se calarem e engolirem os abusos sofridos. Quão distante estamos nós – mulheres consideradas sãs – da loucura que nos espreita? Que nos espera? Que nos avisa que basta um sorriso largo, um silêncio longo, um grito raivoso, um tom de voz alterado para perdermos nossos lugares, nunca cativos, na sociedade higienista e organizada?

As loucas: quais paredes as confinam depois de depositadas tão longe dos olhos que só veem a normalidade nos papéis que devem ser meticulosamente desempenhados? De que água bebem, de que vinho se embriagam? Que religião inauguram, arrancando as próprias vestes e rasgando a carne do peito?

A insanidade das mulheres: usada como ferramenta de manutenção e castração do nosso desejo, de nossa autoconstrução, autodeterminação, do direito de decidir sobre nossas vidas e nossos corpos.

De que se alimentam as loucas? De qual pão sorvem sua força e de qual credo acalentam seu espírito? Dominadas ora pelo furor religioso, ora pelo descontrole das paixões – a louca é a selvagem, a mulher improdutiva que não serve docilmente ao trabalho e ao consumo? É a que se entrega ao prazer ou aquela que nega o acesso a sua carne? É a moça piedosa que se recolhe num convento ou a prostituta que se sustenta vendendo o que pensa que lhe pertence? É a mãe assoberbada que definha em silêncio, a que interrompe sua gravidez, ou a Medeia que mata os próprios filhos?

Talvez, tenhamos medo de saber quem são as loucas. Medo de conhecer seus rostos, de ouvir suas vozes, de ler o que escrevem, de nos importarmos com sua condição. São contagiosas? É vergonhoso ser sua amiga? É perigoso nos aproximarmos? É verdade que a mera menção ao que elas são e à forma como são tratadas funciona como um alerta, um choque elétrico autoinfligido que retesa nossos músculos e nos obriga a retroceder, a evitar o próximo e derradeiro passo. Quando se é mulher, não há um critério claramente definido.

Como o personagem retratado na carta número zero do Tarot – O Louco – dançamos todas à beira do abismo: uma rosa nas mãos, os olhos distraídos, bastando apenas um leve escorregão para sermos prontamente convencidas de que a louca nos encara do espelho.

 

Olivia Batista de Avelar. Professora de inglês, pós graduada em filosofia, apaixonada por cinema e escritora
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