A intimidação sistemática, intencional e repetitiva capaz de causar violência física ou psíquica às vítimas de bullying pode configurar crime ou ato infracional, quando o agressor ainda não atingiu a maioridade.
A informação é da promotora de Justiça Juliana Ortega Tavares, titular da 2ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de Cachoeiro de Itapemirim.
Segundo ela, a ação de adolescentes que em comportamento de bullying agridem outros colegas de escola pode se caracterizar como lesão corporal prevista no artigo 129 do Código Penal.
“Assim como acontece com as ameaças (artigo 147 do CP), os cometidos contra a honra, calúnia, injúria e difamação, entre outros, sendo passíveis de gerar consequências legais, tais como a aplicação de medidas socioeducativas”, complementa.
No que concerne ao bullying, lembra, é importante esclarecer que esse comportamento se caracteriza pela intimidação sistemática, intencional, repetitiva, capaz de causar violência física e/ou psíquica na vítima.
“Em Cachoeiro de Itapemirim já ingressamos com ações judiciais visando a socioeducação de adolescentes que praticaram bullying”, relata.
A promotora diz que isso aconteceu justamente porque nestes casos foi possível identificar que a conduta impetrada se amoldava perfeitamente aos tipos penais previstos na legislação criminal.
Juliana Ortega afirma que caso não sejam adotadas providências pela equipe escolar ou em qualquer hipótese onde a família precise de orientação e/ou ajuda para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes, o Conselho Tutelar, o Ministério Público, através das Promotorias de Justiça da Infância e Juventude, bem como a Defensoria Pública, podem e devem ser acionados.
“É necessário destacar que a legislação em vigor impõe ao estabelecimento de ensino deveres, tais como a promoção de medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate ao bullying, promovendo a cultura de paz nas escolas”, acrescenta.
Juliana Ortega Tavares lembra que escola é fator de proteção, e dessa forma deve ser um espaço de escuta, de pacificação, de transformação de valores negativos em socialmente aceitáveis.
“Círculos de diálogo, espaços de mediação de conflitos, assembleias onde os jovens possam discutir seus problemas coletivos, equipes de ajuda e mapeamento das relações interpessoais, são algumas das medidas geradoras de conexão positiva no ambiente escolar e podem prevenir atos de violência, incluindo o bullying”, ressalta a promotora.
Outro fator que Juliana considera muito importante é a conscientização e a fiscalização dentro das escolas, que devem andar de braços dados com o monitoramento e a educação familiar.
Isso poderá prevenir e identificar o quanto antes situações que causem risco ou sofrimento a crianças e adolescentes, de forma que seus direitos sejam efetivamente garantidos, acredita a promotora.
Saúde Mental
Juliana Ortega destaca ainda que demandas envolvendo depressão, ansiedade e outras questões afetas à saúde mental de crianças e adolescentes veem crescendo exponencialmente.
Segundo ela, infelizmente é possível afirmar que esse crescimento se deu principalmente no pós-pandemia, quando os quadros ficaram mais nítidos e se agravaram.
“Contudo, a maioria dos atendimentos que chegam à Promotoria de Justiça de Cachoeiro de Itapemirim são pedidos de internação para tratamento de dependência química, em razão do uso abusivo de álcool e outras drogas”, esclarece.
A promotora conta ainda que o tratamento deficiente de transtornos psiquiátricos também leva essa parcela da população ao consumo de substâncias tóxicas, agravando os casos e acarretando a prática de atos ilícitos.
“Em razão da omissão do poder público, mesmo após várias tentativas extrajudiciais, foi necessário o ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério Público, através de um trabalho conjunto da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude e da Promotoria de Justiça da Saúde visando a implantação de um Centro de Atenção Psicossocial Infantil (CAPS-I) em Cachoeiro de Itapemirim”, frisa.
Juliana Ortega Tavares aconselha que a família ou os responsáveis pela criança ou adolescente devem estar atentos à mudanças de comportamento, tais como isolamento, falta de motivação para atividades antes praticadas, bem como para estar em convívio comunitário.
“Ausência de interesse pelo ambiente escolar, marcas pelo corpo, tristeza ou agressividade exageradas, entre outros sintomas e comportamentos, devem merecer a atenção da família”, enfatiza.
A orientação da promotora é que nesses casos a família sempre busque conversar com a criança, adolescente ou jovem visando identificar o que está causando dor e/ou angústia e procure imediatamente a ajuda de profissionais qualificados para avaliação e tratamento.
“Quando for possível perceber que essas alterações podem ter relação com um possível bullying sofrido pela vítima, é fundamental, ainda, o contato permanente com a escola solicitando medidas de combate a todos os tipos de violência no ambiente escolar, especialmente a intimidação sistemática”, concluiu.
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